A calúnia como tática eleitoral, por Janeslei Albuquerque *

A direita manipula pelo medo e a difamação. E não faz isso de hoje. Desde sempre. Quando começamos a construir em nosso país uma situação de maior justiça social e acesso aos direitos de cidadania, a direita se reorganiza e o proto-fascismo sai a campo usando as mesmas táticas: o medo, a calúnia, a difamação e, entre outros, a mentira deslavada. Foi assim com Getúlio Vargas, com Juscelino Kubitschek e com João Goulart. Quem não se lembra quando a direita udenista – hoje representada por José Serra – acusava Jango de corrupção sem limites? É o mesmo discurso e as mesmas táticas. E, agora, com o suporte da tecnologia. O telemarketing é a grande ferramenta utilizada para espalhar mentiras e confundir as pessoas; fazendo com que o lobo passe por cordeiro.

A matéria publicada hoje (15/10), no jornal Correio Brasiliense, denuncia que a campanha de Serra contratou um telemarketing para dizer que Dilma é a favor do aborto. Com isso tenta manipular o voto dos indecisos ou – ainda – de eleitores de Marina Silva, que pertencem ao segmento religioso, ou seja, muitos têm posição doutrinária sobre o tema. O texto publicado no site do Correio Brasiliense é assinado pelo jornalista Ulisses Campbell e é sintomática, diz Ciro Gomes: “José Serra disputando eleição é certeza de baixaria”.

Serra está fazendo aquilo que a direita sempre fez. Isto é, confundir o eleitorado com boatos e mentiras. O jornalista relata: “Recordo-me de uma das muitas cretinices que ouvia na minha meninice e em época de eleições: ‘Na URSS, meu filho, os comunistas colocam todos os cristãos numa grande piscina cheia de coco e ficam passando uma foice gigante de um lado para o outro. ou o cristão perde a cabeça ou é obrigado a comer o coco’.”

Essa é a tática: amedrontar, mentir desabusadamente. Além de contar com a cumplicidade do consórcio midiático, que vem recebendo do governo de São Paulo mais de R$ 250 milhões de dinheiro público desde 2004 – quase tudo sem licitação – , como nos informa a jornalista Conceição Lemes, no blog do Luiz Carlos Azenha em: NaMaria: Desde 2004, PSDB paulista gastou R$ 250 milhões com a mídia (quase tudo sem licitação).

E isso não é uma calúnia. Isso é um fato, com documentos comprobatórios, em diário oficial. É isso que queremos como política pública para o Brasil todo? Porque é essa escolha que faremos dia 31 de outubro. Se não quisermos isso, temos de conversar com nossos alunos, com a comunidade escolar, com os nossos vizinhos. Temos de benzer e salgar esse demônio da calúnia. Serra é o retorno à barbárie, assemelha-se à insanidade medieval que mandou pra fogueira milhares de mulheres em nome da doutrina e usando o nome de Deus em vão. Fariseus modernos usam o telemarketing pra espalhar maledicências e maldades em geral, num vale-tudo eleitoral que pensávamos proscrito da história da República.

 “O caluniador é figura da barbárie”, afirma o professor Juarez Guimarães num artigo assinado e publicado na revista Carta Capital: “O que está ocorrendo aos nossos olhos não pode ser banalizado. O caluniador é uma figura da barbárie, o sinistro que mobiliza o submundo dos preconceitos, dos ódios e dos fanatismos. A calúnia traz a violência para o centro da cena pública, pronunciando a morte pública de uma pessoa, sem direito à defesa. Perante a calúnia não há diálogo, direitos ou tribunais isentos. Na dúvida, contra o “réu”: a suspeição atirada sobre ele, visa torná-lo impotente, pois já, de partida, a humanidade lhe foi negada. Mas quem é o caluniador, essa figura de mil caras e rosto nenhum? É preciso dizer em alto e bom som, em público, o seu nome, antes que seja tarde: o nome do caluniador é hoje a candidatura José Serra! Friso a candidatura porque não quero exatamente negar a humanidade de quem calunia. É o que fez, com a coragem que lhe é própria, a companheira Dilma Roussef no primeiro debate do segundo turno, apontando o nome de uma caluniadora – a mulher de Serra – e chamando o próprio de o “homem das mil caras”.

Convidamos todos e todas que lutam por um mundo mais justo e solidário a dizer não à calúnia, à violência que permeia essa tática. E a dizer sim às conquistas. Convidamos os que participam das lutas da APP-Sindicato pela defesa da liberdade e democracia desde os tempos da ditadura até a nossa recente e frágil democracia no momento atual. Convocamos todos e todas que amam a liberdade de expressão a reafirmar essa conquista democrática. Pois nesse caldo de intolerância que essa campanha inoculou no país, esse direito foi negado na demissão da colunista Maria Rita Kehl, do jornal O Estado de São Paulo, por escrever um artigo em prol da dignidade dos pobres“, segundo o professor Juarez.

Que todos e todas que repudiaram e repudiam a ditadura, repudiem também essas práticas e seus agentes. Repudiemos a ditadura. Essa que Dilma enfrentou na juventude dos seus 19 anos como tantos outros jovens. Jovens como o filho de Zuzu Angel, mãe de Hildegard Angel, hoje jornalista. Zuzu teve seu filho preso, torturado e morto nos porões da ditadura. Na luta pelo direito de receber ainda que fosse o corpo do filho assassinado, ela também, Zuzu, acabou morta pelo terrorismo de estado largamente praticado nesse período.

Dilma sobreviveu ao inferno da dor e da humilhação da prisão política. Tantos outros, como o filho de Zuzu, não tiveram a mesma sorte (?). Em homenagem a Zuzu Angel e sua peregrinação por delegacias e IML’s em busca do filho, Chico Buarque dedicou uma das mais belas canções da música popular brasileira: “Angélica”.

E os mesmos que pediram, sustentaram, apoiaram e se beneficiaram desse regime de terror – até hoje não devidamente estudado e debatido nas aulas de história em nossas escolas e tampouco em nosso currículo. Aqueles estão de novo a arreganhar os dentes contra aquela jovem Dilma.  A jovem que teve a ousadia de abrir mão do conforto de uma família de classe média e arriscar-se em nome da liberdade e da democracia para todos. Arriscar-se em defesa da Pátria, tão amada e tão “subtraída em tenebrosas transações…”

De novo se constrói uma linha divisória. De novo estão desse lado os intelectuais progressistas como Emir Sader, Juarez Guimarães, Leonardo Boff, Flávio Aguiar, Marilena Chauí, Chico Buarque, Eric Nepomuceno, Gilson Caroni, juristas como Celso Antônio Bandeira de Mello e o teólogo Mario Sérgio Cortella e tantos outros. E, do outro lado, o submundo das organizações neonazistas e TFP e seus arautos.

Não por acaso o governador eleito do Rio Grande do Sul alerta que o clima que se instalou, de infâmia, difamação e propagação de toda sorte de mentiras, lembra o golpe de 64. Tarso afirmou nesta quarta-feira (13/10), em Porto Alegre, que “o clima atual de golpismo político, irradiado pela campanha demotucana lembra os preparativos para a derrubada do governo João Goulart em 1964. Hoje, como ontem, há, de novo, manipulação da informação com cumplicidade da maior parte da grande imprensa”.

Sugerimos a leitura em cada sala de aula, em cada sala dos professores do texto “O caluniador, figura da barbárie“.  Incentivamos nas escolas a reprodução e distribuição desse libelo do Professor Juarez Guimarães, da Universidade Federal de Minas Gerais.

Que se discuta, que se abra o debate sobre o Brasil que queremos. Pois estamos sim num limiar civilizatório: se vamos avançar para novas conquistas democráticas, para a efetivação das resoluções da Conferência Nacional de Educação (Conae). Ou se vamos retroceder às privatarias furiosas do patrimônio público, tendo à frente as disputas internacionais sobre quem deve ter soberania sobre as reservas do Pré-Sal e as novas reservas de gás natural que a Petrobrás descobriu.

Podemos decidir neste dia 31 de outubro se vamos ter Petrobras – com Bras, de Brasil, de Brasileira – ou Petrobrax, já ‘estrangeirizada’ para o gosto dos novos donos representados comercialmente no Brasil pelo genro de Fernando Henrique, David Zilberztjein, que foi presidente da ANP no governo tucano. São essas fabulosas riquezas que estão em disputa, o resto é apenas tática para se tentar vencer as eleições a qualquer preço. Mesmo que o preço seja o encolhimento da cidadania e dos direitos do povo brasileiro.

Lembro aqui, para finalizar, um e-mail que frequentemente chegava aos nossos correios eletrônicos. Dizia que “os deputados aprovaram um Projeto de Lei (PL) – acabando com o 13º, FGTS, férias, licença-maternidade”. Cheguei a muitas escolas e estava lá a mensagem que alguém imprimiu e colocou na sala dos educadores.

Pois bem, esse PL chegou a ser apresentado e – em primeira votação – foi aprovado na Câmara Federal em 2002. Dei essa resposta inúmeras vezes para muita gente. Vale a pena pesquisar e ver quem é o grupo político que apresentou e que partidos votaram a favor disso.

Em São Paulo o Serra não deixou aprovar a licença-maternidade de seis meses. É. Esse mesmo Serra que enche seu programa de. TV de mulheres grávidas, que diz uma coisa na TV e na vida real faz outra. Sobre esse aspecto do caráter de Serra você pode conferir no vídeo Serra Coerência”.

Na capital paulista, a metade dos professores da rede estadual tem contrato temporário, contrato precário, pois não há concurso há quase duas décadas com vagas reais. Não há eleição direta para direção nas escolas. Não há isonomia entre aposentados e profissionais da ativa. Mais de mil escolas foram fechadas com superlotação de salas de aula e há precarização das condições de trabalho. Na última greve, Serra apresentou com toda a virulência o seu conceito de democracia e sua relação com os movimentos sociais. O site da CNTE mostra a relação dele como governo, com a Educação. Uma coisa é o que o Serra diz… …Outra coisa é o que o Serra faz…

Leia, reflita. Espalhe a sensatez e a racionalidade a sua volta. A escola, lugar de conhecimento, ciência e saber, tem também a tarefa de combater o obscurantismo, a falácia, o farisaísmo, a mentira, a calúnia, que são prenúncios de barbárie. 

* Professora Janeslei Aparecida Albuquerque

Secretária Educacional da APP-Sindicato

Professora de Língua e Literatura Brasileira do Colégio Estadual do Paraná

Mestre em Educação – UFPR

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