Os descontos na Gratificação de Tecnologia e Ensino (GTE) de professoras com problemas graves de saúde ou em licença-maternidade são a nova face da maldade do governo Ratinho Júnior. Um decreto assinado pelo governador e pelo secretário da Educação, Roni Miranda, determina que o valor da GTE seja subtraído do salário dos(as) docentes que estiverem em licenças previstas em lei com duração de mais de 15 dias.
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“O governador não pensou na minha família quando fez esse decreto. Ele não pensou na subsistência dos meus filhos, na minha dignidade como mãe, amamentando”, afirma a professora de Artes na rede estadual, Thamiris Langue Mysczak.
A docente, que trabalha em Colombo, foi surpreendida com um desconto de 25% no salário desse mês, referente às GTEs dos meses de junho e julho, totalizando de R$ 1.146,78, em plena licença-maternidade.
“O orçamento lá em casa ficou complicado. Eu não sei de onde vou tirar dinheiro para fechar as contas. É uma situação desesperadora. Fui pega de surpresa e me sinto punida por ser professora, mulher e mãe”, desabafa.
A covardia do governador, que ataca trabalhadoras quando estão fragilizadas, abriu um turbilhão de dúvidas na cabeça de Thamiris. “Isso é um absurdo e acaba com a nossa dignidade, com a nossa vontade de ser professor. Que garantias eu vou ter para cuidar da minha família? E se um dos meus filhos ficar doente? Vou ter que levá-lo para a escola comigo? O que eu vou ter que fazer para não ter meu salário retirado?”, diz.
“Decreto da maldade”
O decreto de Ratinho Jr. tornou ainda mais difícil a luta contra o câncer para trabalhadoras como a professora de apoio especializado que atua em um colégio estadual de Curitiba, Silvana Raquel Sarmento.
“Esse mês veio um desconto de R$ 1.692,64. Tive esse desconto do GTE porque faço um tratamento oncológico e tive dois atestados devido a consulta. Neste tempo, sofri um acidente de trabalho. Fui atingida por uma bola de vôlei quando me deslocava para a sala dos professores no intervalo da manhã. Tive duas fraturas no dedo, precisei colocar tala de gesso e a ortopedista atestou 30 dias e o atestado abrangeu o recesso”, conta Silvana.
O resultado foi a necessidade de fazer mais um empréstimo bancário, comprometendo a renda líquida futura para tapar o buraco aberto no presente por Ratinho Jr.
“Fiquei muito chateada, desolada, impotente. Já faço um tratamento de saúde que não é fácil, procuro conciliar exames e consultas para que não precise me ausentar tanto da escola, mas isso não é reconhecido”, lamenta.
Silvana está na carreira por vocação, mas admite que a desvalorização profissional preocupa. “A carreira não é mais atrativa, infelizmente. Está muito desvalorizada”, observa.
Thamiris tem a mesma opinião. “Todo professor tem amor pela profissão, só que o sistema muitas vezes se aproveita desse amor, sobrecarregando o profissional. Longe da romantização, nós não somos super-heróis, nós temos uma vida, uma família para sustentar, boletos para pagar, e quando eu me percebo neste lugar de mal conseguir dar uma vida com a qualidade mínima que meus filhos merecem, por conta da profissão que eu escolhi, é muito triste não ter estabilidade nesse sentido, estar com um bebezinho de três meses para sustentar e ter seu salário reduzido”, diz.
A tristeza de Thamiris se transformou em indignação e recusa a desistir. “Às vezes eu penso em me exonerar, e tenho procurado outros concursos que tenham mais estabilidade, vale-alimentação e plano de saúde e que garanta acesso às terapias que meu filho autista necessita. No entanto, lembro das professoras que lutaram antes de mim e penso que não é justo o governador Ratinho Jr. e o secretário Roni Miranda retirarem nossos direitos. Não está certo reduzir o sustento de uma mãe e de seus filhos, não é digno punir quem está lutando pela vida, no combate ao câncer. Por isso, ao invés de desistir, procurei apoio da APP”, afirma Thamiris.
“Esse decreto da maldade, entre outras coisas, contém violência de gênero, pois me sinto dois passos atrás de meus pares, homens, que não entram em licença-maternidade e que lá na frente terão uma média salarial maior na aposentadoria”, ressalta Thamiris.
A mãe de Thamiris, que também é professora QPM e está em tratamento de câncer de mama foi quem a avisou dos descontos.
“Ela veio desesperada me pedir para ajudar a verificar porque no salário dela veio quase R$ 2 mil a menos. Fui ver o meu e estava com desconto também. Fui procurar esclarecimento no grupo da escola e descobri que qualquer professor com licença acima de 15 dias teve o GTE cancelado, a partir de 1º de junho. E veio tudo de uma vez, retroativo no pagamento de agosto. Fiquei perplexa”, relata Thamiris.
APP-Sindicato leva denúncia ao MPT
Na terça-feira desta semana, a APP-Sindicato protocolou uma denúncia no Ministério Público do Trabalho (MPT) pedindo a abertura de investigação contra o governo Ratinho Jr. pelos descontos ilegais na GTE.
O sindicato também solicita que sejam adotadas medidas de urgência para que a Secretaria da da Educação (Seed) pare imediatamente de efetuar os descontos e devolva os valores já retirados dos(as) trabalhadores(as).
“O nosso jurídico está buscando as vias judiciais para garantir que a gratificação seja mantida no caráter para o qual ela foi criada e que não sejamos punidos por sermos mães ou por termos que nos afastar do trabalho para tratar da nossa saúde”, relata a presidenta da APP-Sindicato, Walkiria Mazeto.
Decreto desumano
Na denúncia, a APP explica que a iniciativa desumana do governo tem sua origem na publicação do Decreto 8222/24, que alterou o Decreto 10.051/22, incluindo regras punitivas para a concessão do benefício.
Criada como forma de compensação financeira pelos investimentos em tecnologia feitos pelos(as) docentes, com as alterações, a gratificação passou a ser regulada por assiduidade. Em caso de uma falta injustificada no mês, o desconto é de 50%, em caso de duas faltas, 100%.
Mas a crueldade do governo Ratinho Jr. foi além ao determinar a suspensão total do pagamento da GTE nos casos de licenças legais com duração de mais de 15 dias. Essa regra atingiu em cheio professores(as) em tratamento de câncer, licença-maternidade e outras situações de adoecimento grave ou incurável.
A situação ficou ainda mais agravada porque a Seed implantou as novas medidas na folha de pagamento do mês de agosto, com efeitos retroativos ao mês de junho. O resultado é que há vários casos onde os descontos passam de R$ 2 mil.
“São inadmissíveis as alterações que a Secretaria da Educação fez na GTE. Isso é cruel, é desumano. Não existe esse método de desconto em gratificação e redução de salário em nenhuma outra secretaria do Estado do Paraná. Isso só está acontecendo na Educação. É impressionante a saga que a Seed tem travado para nos punir e nos perseguir enquanto professores e funcionários de escola”, critica a presidenta da APP.
Professores PSS
A APP-Sindicato também apresentou ao MPT a gravidade da situação em relação aos(as) servidores(as) PSS (Processo Seletivo Simplificado), que lecionam em condição de trabalho precária, sem estabilidade ou garantias plenas.
“Submeter esses trabalhadores a cortes arbitrários, atrelados a licenças médicas e maternidade, representa um quadro de exploração, discriminação e violação da proteção constitucional ao trabalho”, relata a denúncia.
O valor da Gratificação de Tecnologia e Ensino paga aos docentes com carga horária de 40 horas semanais é de até R$ 846,32. Em reunião com o secretário da Educação, Roni Miranda, no final do mês de agosto, a diretoria da APP-Sindicato exigiu a revogação dos dispositivos punitivos e reivindicou que o valor da gratificação seja incorporado ao salário dos(as) professores(as).
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