Lista da Seed com melhores colégios públicos do Paraná no Enem não tem nenhum cívico-militar

A tentativa do governo Ratinho Jr. de manipular indicadores educacionais para fazer propaganda de sua gestão, possivelmente visando a campanha eleitoral de 2026, acabou por confirmar o fracasso de um dos seus principais projetos ideológicos e de alinhamento com a extrema direita, o modelo de escolas cívico-militares.

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De acordo com uma lista divulgada pela Secretaria de Estado da Educação (Seed) com os colégios públicos do Paraná que mais pontuaram no Enem 2024, nenhum dos colégios que aparecem no ranking seria cívico-militar. Ou seja, dados do próprio governo desmentem a propaganda ideológica e confirmam que o modelo tradicional de ensino produz melhores resultados.

Para elaborar o ranking e criar a manchete positiva, o governo excluiu outras escolas públicas, como as que fazem seleção para ingresso de estudantes, e também os estabelecimentos privados que obtiveram melhores pontuações. 

Somente após fazer esta manobra, o governo chegou ao dado em que sete escolas públicas paranaenses aparecem entre as 50 melhores colocadas. Porém, segundo a listagem, todas seriam do modelo tradicional de ensino, sem a presença de militares, que recebem salário maior do que o que é pago aos(às) professores(as).

 

Chama a atenção a constatação de que dos sete estabelecimentos citados pelo governo, segundo o site Consulta Escola, da Seed, dois colégios – João Arnaldo, de Toledo, e Lauro Tavares, de Rolândia – seriam militarizados. Não se sabe, no entanto, porque a publicação do governo ocultou esse dado ao informar o nome dos estabelecimentos de ensino. O fato é que, ainda assim, o número de escolas cívico-militares que aparecem neste ranking é muito inferior ao de escolas do modelo tradicional.

Ainda de acordo com o material da Seed, embora o Paraná divulgue a propaganda de que tem a melhor educação do país, o estado seria o terceiro com mais escolas públicas entre as melhores ranqueadas do Brasil, atrás apenas do Rio Grande do Sul, com 12 escolas, e de São Paulo, com oito.

As sete escolas públicas com as maiores médias do Paraná no Enem, segundo a divulgação da Seed são o Colégio Estadual Vila Alta (Alto Paraíso): 612,16; Colégio Estadual de Laranjeiras do Sul (Laranjeiras do Sul): 604,34; Colégio Estadual João Arnaldo (Toledo): 592,85; Colégio Estadual Lucia Alves de Oliveira Schoffen (Altônia) 592,56; Colégio Estadual Lauro Tavares (Rolândia): 591,55; Colégio Estadual Octávio Tozo (Cascavel): 586,69; e Escola Estadual Juscelino Oliveira (Maringá): 584,02.

Modelo autoritário

Até hoje, o governo não conseguiu comprovar a efetividade do modelo cívico-militar. Pelo contrário, especialistas apontam que a militarização acentuou o autoritarismo e aumentou as denúncias de casos de abuso e violência nessas unidades. Longe de serem situações isoladas, os casos, denunciados pela APP-Sindicato e veiculados na imprensa, reforçam os alertas e a necessidade de encerramento definitivo deste modelo de ensino.  

A promessa de maior segurança nas escolas, com a alocação de um militar aposentado, é uma farsa utilizada pelo governo de Ratinho Jr. para promover uma educação autoritária e militarizada para os filhos e filhas da classe trabalhadora.

Segundo a professora de Filosofia na rede pública estadual, Merielle Camilo, autora da tese de doutorado “A Epistemologia do Negacionismo: A Necropolítica do Novo Ensino Médio no Paraná, Plataformização e Militarização”, a militarização das escolas é perigosa para a formação educacional de crianças, que tendem a perder seu senso crítico nesse modelo.

“É extremamente nocivo para a formação crítica de toda uma geração de crianças a introdução distorcida de práticas militares e de seus códigos normativos, que, no passado, fundamentaram as bases do pensamento fascista. Essa mesma ideologia parece ressurgir nas instituições de ensino militarizadas do Brasil, colocando a população civil sob regulamentos alheios à sua realidade cotidiana.”

Militares ganham mais do que educadores(as)

Em sua maioria militares da reserva, os(as) monitores(as) militares são contratados(as) para executar funções como acompanhamento de estudantes na chegada à escola, monitorar corredores e pátios durante as aulas e cuidar dos(as) estudantes durante a saída. As funções são similares às realizadas pelos funcionários(as) de escola que têm formação adequada para atuar no ambiente escolar e na interação com os(as) estudantes.

A diferença fica por conta do salário. Enquanto os(as) funcionários(as) (Agente I) recebem no início de carreira R$ 2.066,29 – atualmente grande parte recebe cerca de R$ 2.769,03 na classe VII da tabela – , os(as) monitores(as) militares ganham uma gratificação de R$ 5.500,00, valor que é somado com aposentadoria que já recebem, paga pelo Estado. Só a gratificação é o suficiente para pagar o salário de quase três funcionários(as) (Agente I).

Na comparação salarial com os(as) professores e pedagogos(as), que passam anos na faculdade para obter a formação adequada para dar aulas e fazer planejamento e gestão das unidades escolares, os militares também ganham mais. O piso salarial pago por Ratinho Jr. aos docentes, para uma jornada de 40 horas semanais, atualmente é de R$ 4.920,56. Ou seja, quase R$ 580 menor do que o dos militares. Só com essa diferença, em apenas 12 meses os militares recebem cerca de R$ 7 mil a mais do que um professor.

Ação no supremo pede fim do modelo

Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), pede a declaração de inconstitucionalidade da Lei 20.338/2020, que criou o Programa Colégios Cívico-Militares do Paraná, e do art. 1º, inciso VI, da Lei 18.590/2015, que proíbe a realização de eleições para escolha da direção nas escolas cívico-militares.

Em manifestação no processo, a Advocacia-Geral da União (AGU) considerou que o programa de escolas Cívico-Militares de Ratinho Jr. é inconstitucional. O parecer da AGU argumenta que os estados não podem instituir um modelo educacional que não esteja previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Além disso, o órgão ressalta que a Constituição Federal não prevê que militares possam exercer funções de ensino ou de apoio escolar.

A posição da AGU reforça o caráter inconstitucional do projeto, que vem sendo adotado por governadores(as) alinhados(as) à extrema-direita para agradar a base reacionária. O relator do caso no STF é o ministro Gilmar Mendes. 

Caso o STF julgue inconstitucional, o parecer pode ter efeito em outros estados, como São Paulo, onde o modelo do Paraná também foi implantado. Em 2024, a Advocacia-Geral da União (AGU) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer defendendo a inconstitucionalidade das escolas paulistas  militarizadas. O modelo é alvo de ações protocoladas no STF pelo PT e PSOL, após a aprovação do projeto de Tarcísio de Freitas e Renato Feder.

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